Buffet Jorge Churrasco |
A história do churrasco brasileiro tem sombras longas.
Começa necessariamente no século XVII, no interior dos Sete Povos das Missões,
comunidade criada pelos jesuítas no oeste do Rio Grande (abarcando Paraguai e
Argentina) para reunir indígenas – em especial guaranis – na missão
catequisadora. Destruída em 1768, a comunidade deixou como testemunho, além das
ruínas, um belo exemplo de sociedade ideal para os homens e sua profunda
influência na colonização. É que os rebanhos ali criados, sem dono após a guerra
de destruição, ganharam os campos e ali se multiplicaram ao sabor da natureza.
Era riqueza muito vistosa para não ser aproveitada naquele Brasil – colônia que
crescia atrás do ouro. Por isso os preadores passaram a descer de Laguna e São
Paulo para apresá-los. Eram os tropeiros, cuja refeição básica nas breves
paradas de acampamento consistia num pedaço de carne fresca, assada ao calor
das brasas no chão e temperado com um pouco de cinza.
O historiador Dante de Laytano identifica nessa gente o
primeiro ciclo de ocupação do estado. “ O segundo foi o do invernador, que já
era siminômade e se obrigava a parar no caminho para engordar o gado e
proteger-se do inverno”, diz ele. Assim como nos caminhos dos tropeiros, nos
seus também foram brotando cidades. E como os tropeiros, invernadores e seus
peões tinham no gado assado sua dieta principal, agora salgado. Eles haviam
copiado dos índios o costume de colocar mantas de carne sob o arreamento, no
lombo do cavalo, enquanto cavalgavam. No ponto de parada, devidamente salgado
pelo suor do animal, a carne estava pronta para ir ao fogo.
Como se vê, o churrasco tornou-se fio condutor da história
rio grandense e prosseguiu nesse papel durante o terceiro ciclo da fixação a
terra, a chamada “civilização do estancieiro”. Agora já era uma larguíssima
fazenda organizada, na qual a peonada saía para distantes lidas de gado, que
duravam semanas, meses e cujo cardápio era o churrasco, nutritivo e fácil de
fazer com carne à mão. Foi nesse momento que tomou a forma de típico churrasco
gaúcho como o conhecemos, com fogo de chão e espetos de carne fincados na terra
ao redor.
A receita não podia ser mais simples: carne com alguma
gordura – em geral costela -, coberta de sal e levada ao fogo demorado, assando
primeiro de um lado e depois do outro. “Mas o churrasco não é exclusivo do Rio
Grande, existiu em toda América do Sul antes do Descobrimento.
De fato, os registros históricos se referem ao coócai, um
assado primitivo e ao coócatuca, carne no espeto, usado pelos índios. A verdade
é que no século passado, a modalidade do fogo de chão estava definitivamente
consagrada, a julgar pelo depoimento do naturalista Saint Hilaire, de 1821.
“Logo chegando ao lugar onde pisei, meu soldado fez uma grande fogueira; cortou
a carne em compridos pedaços da espessura de um dedo, fez ponta em uma vara de
cerca de dois pés de comprimento e enfiou-o a guisa de espeto em um dos pedaços
de carne e quando julgou suficientemente assado, expôs o outro lado. Ao fim de
um quarto de hora esse assado podia ser comido, parecendo uma espécie de
beefsteak suculento, porém de extrema dureza.
Somente em tempos mais recentes o churrasco gaúcho
incorporou outros cortes do gado, como a picanha ou fraldinha. A novidade veio
na esteira de uma série de inovações introduzidas no prato a partir desse
século, pela colonização italiana que se fixou no norte e na região da serra do
estado. Para os italianos, churrasco era comido apenas em dia de festa, valiam
vários cortes e era preparado de véspera, com os pedaços de molho em vinha
d’alhos. Foi dali que nasceu o popularíssimo “rodízio” ou “espeto corrido”,
como dizem os gaúchos, com os acompanhamentos que um velho gaudério jamais
admitiria, além de levar frango e carne de porco. (A moda do espeto e da grelha
acabou entrando até na área de peixes).
Por curiosa coincidência, os pioneiros bem sucedidos no
espeto corrido vieram de Nova Bréscia, pequena cidade encravada na serra, a 167
km de Porto Alegre. A cidade exibe na praça principal a estátua de um
churrasqueiro com avental branco, faca e espeto nas mãos.
Fonte: Churrasco e companhia
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